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Goleiro volta a ser vítima de ofensas racistas na segunda divisão de PE: “Essa m… quer que a gente chame ele de bonitinho”

O caso contra Rodolfo, do 1º de Maio, aconteceu na partida diante do Decisão, em Sertânia. O goleiro criticou a atitude da arbitragem que, segundo ele, foi omissa. O caso foi relatado na súmula

Por Redação do ge — Sertânia, PE

10/10/2022 10h40  Atualizado há 19 horas


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O goleiro Rodolfo, da equipe do 1º de Maio, voltou a ser alvo de ofensas racistas durante jogo da Série A2 do Campeonato Pernambucano. Desta vez, o caso foi registrado na partida contra o time do Decisão, no estádio Odilon Ferreira, na cidade de Sertânia. De acordo com o jogador, as agressões partiram de uma pessoa que estava na arquibancada, no segundo tempo do confronto.

– Por volta de 15 a 20 minutos do segundo tempo, tinha um torcedor na arquibancada da torcida adversária que começou a me gritar com palavrões, xingamentos racistas, e eu gritei para ele que ele me respeitasse. Eu já tinha identificado ele e ele continuou.

“Ele continuou mais porque as pessoas que estavam em volta dele começaram a rir da situação. As pessoas não recriminaram ele”, diz o goleiro.

Goleiro Rodolfo — Foto: Clédiston Ancelmo

Goleiro Rodolfo — Foto: Clédiston Ancelmo

Rodolfo conta que alertou o árbitro Paulo Belence Alves dos Prazeres Filho e o capitão do 1º de Maio sobre o caso, pedindo a paralisação do jogo, para que o autor das ofensas fosse identificado e retirado do estádio, mas isso não aconteceu.

– Chamei o juiz e o capitão do meu time, pedindo que o juiz paralisasse o jogo, para que eu identificasse o rapaz ao juiz e o juiz chamasse a polícia para que tirasse aquele rapaz dali. E o juiz não fez isso. No que o juiz não fez, ele continuou a gritar e o pessoal continuou dando risada. Foi uma coisa que começou a se potencializar naquele momento. Chamei o juiz de novo, gritei para o bandeirinha que estava do meu lado esquerdo, gritei para o quarto árbitro para que eles tomassem uma providência e eles não tomaram. Chamei o juiz novamente e ele ameaçou me dar um cartão, se eu continuasse falando.

“O juiz falou para mim que era minha palavra contra a torcida. Aí eu fiquei sem reação, porque além de ser constrangido pela situação, eu estava sendo ameaçado pelo juiz que se eu continuasse falando, seria expulso”.

O goleiro do 1º de Maio segue o relato afirmando que, após o jogo, foi conversar com o árbitro, para explicar a situação. Segundo o jogador, o árbitro disse que “era a minha palavra contra a torcida”.

– Aí o bandeirinha que estava do meu lado esquerdo falou que eu ia ser expulso se continuasse falando daquela forma. Aí eu falei: “Tudo bem, já entendi o que está acontecendo aqui, não vou falar mais nada, vou para o vestiário e vou pedir ao presidente do clube que tome providência contra tudo isso que está acontecendo, porque eu já percebi que vocês não estão dando a devida atenção”.

Rodolfo lamentou o fato das pessoas que estavam ao lado do agressor tenham sido omissas e coniventes com as ofensas.

– O que mais me indignou, não foi o ato racista do rapaz, que chegou o momento tão ridículo da cena, eu pedindo para que ele me respeitasse, e ele ainda usou a seguinte frase: “Essa m… quer que a gente chame ele de bonitinho”. Que absurdo. E o pessoal, um monte de gente, mães de família, jovens, todo mundo dando risada daquela cena. Eu falei, meu Deus. Gritei para o árbitro, desesperado. Chegou um momento que perdi até a cabeça durante o jogo, porque fiquei muito revoltado diante da situação que eu estava vivendo.

Embora a maioria tenha sido conivente, o goleiro diz que, após o jogo, recebeu a solidariedade de um outro torcedor.

Estádio Odilon Ferreira, Sertânia — Foto: Tiago Pavão / FPF

Estádio Odilon Ferreira, Sertânia — Foto: Tiago Pavão / FPF

– Acabou o jogo, fui para o vestiário e quando estava descendo, veio um torcedor que viu a situação toda e falou para mim: “Irmão, me perdoe. Eu sou daqui, eu estava ali do lado da torcida, estava vendo tudo e fiquei muito envergonhado”. Ele chegou para o árbitro e falou que realmente tinha acontecido o que eu disse. Chegou para o policial e falou e perguntou porque eles não tomaram uma providência. Aquilo me mostrou o quanto eles foram muito omissos.

Esse é o segundo episódio racista sofrido por Rodolfo na Série A2. O primeiro, foi em Pesqueira, contra o time da casa. O goleiro lamenta que atitudes assim estejam se naturalizando.

“Isso aconteceu há 15 dias comigo na cidade de Pesqueira, ontem aconteceu aqui em Sertânia. Isso foi pra mim a pior prova da imundice que está essa situação do racismo, porque as pessoas estão levando isso de forma muito natural. Ficou uma coisa natural”.

– Então, assim, é revoltante eu ter que está constatando isso em um estado tão lindo e tão maravilhoso como Pernambuco. Um estado que eu aprendi a admirar e gostar pelo seu povo e por tudo. Mas, eu tenho me visto entristecido por essa situação, que óbvio, não é generalizar um estado maravilhoso como esse, por conta de pessoas que não têm o mínimo de compreensão social.

– A minha esposa está em casa revoltada, porque são coisas que você para pra analisar e você não vai acreditar. Quem viu a cena ontem, que foi o capitão do time que a gente chamou, nós ficamos desesperados porque o árbitro não deu a mínima importância para a situação. E eu acho que ele relatou na súmula porque o presidente do clube, eu e o capitão fomos em cima dele. Um policial chegou e perguntou porque ele não parou o jogo para que fosse identificado o rapaz e houvesse a situação de lavar o rapaz à delegacia, mas ele ficou sem reação.

– Então, assim, para mim é independente uma situação dessa. É humilhante. Essa é a palavra certa, humilhante. Sinceramente, em nem sei o que te dizer mais e nem sei o que esperar mais daqui por diante, porque se tornou uma coisa banal – continua Rodolfo

O árbitro Paulo Belence Alves dos Prazeres Filho relatou o caso na súmula. No documento, o juiz diz que aos nove minutos do segundo tempo paralisou o jogo por um minuto, após o goleiro Rodolfo ter relatado que estava sofrendo “supostas ofensas racistas, vindo da arquibancada dizendo as palavras: Vai negão”.

Súmula do jogo entre Decisão x 1º de Maio — Foto: Reprodução / FPF

Súmula do jogo entre Decisão x 1º de Maio — Foto: Reprodução / FPF

Ainda segundo a súmula, o caso foi comunicado ao delegado do jogo, pedindo para que ele averiguasse a situação no local apontado pelo goleiro. O árbitro finaliza o relato informando que “nenhum membro da equipe de arbitragem e nem o delegado da partida conseguiu identificar o autor das supostas ofensas e nem mesmo as próprias ofensas”.https://d236a0ec5ddf38c714e426f51226ef38.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

– Eles não identificaram porque quando eu chamei eles para levá-los até o rapaz que estava fazendo o ato, eles não quiseram parar o jogo. Não me ouviram, não me deram atenção. Eles ameaçaram me dar cartão se eu continuasse falando, por isso que eles não identificaram. Eles mesmo foram omissos, essa é a realidade. Eu avisei ao árbitro, avisei ao quarto árbitro, avisei ao bandeirinha… avisei a todo mundo e ninguém me deu atenção ou parou o jogo para fazer o que tinha que ser feito. Um policial veio cobrar deles, o motivo deles não terem parado o jogo para ser feita a identificação – questiona o goleiro.

O goleiro disse que não conseguiu prestar queixa contra o torcedor.

– Não tinha como, porque ele [árbitro] me falou que para prestar queixa eu teria que sair do jogo, levar o rapaz que estava me agredindo de forma racista até a delegacia. Que loucura. A falta de habilidade dessas pessoas para lidar com uma situação dessas. Foi terrível. Uma cena que não desejo para ninguém. Me senti coagido por eles mesmo que deveriam, naquele momento, agir de forma mais consciente.

“Ontem, para mim, das situações que eu já passei, foi a pior. Eu não me senti somente agredido pelo torcedor e aqueles que estavam compactuando daquela situação, mas pela arbitragem que foi extremamente conivente com aquela situação”.

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Nas redes sociais, o Decisão lamentou o caso e se solidarizou com o goleiro Rodolfo.

(Fonte: GE Petrolina e Região)