Criança morta em van e ônibus sem ar: o que acontece com o corpo em locais fechados com altas temperaturas?

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Onda de calor e locais fechados sem ventilação são uma combinação extrema para a saúde

Na última terça-feira, uma criança foi encontrada morta em uma van escolar após passar horas esquecida dentro do veículo sob um forte calor. Dois dias depois, uma mãe, em atitude de desespero, quebrou a janela de um ônibus após seu filho passar mal no coletivo, que tinha as janelas fechadas e travadas, mas sem ar-condicionado. Os episódios revelam uma combinação extrema para o corpo: calor e local fechado — sobretudo para crianças e idosos.

A tragédia que matou o menino de apenas dois anos aconteceu em Vila Maria, na zona Norte de São Paulo, quando a capital paulista superou os 37°. E se o corpo já sente os efeitos da onda de calor ao ar livre, os sintomas são agravados em locais fechados.

— Em um veículo fechado submetido a altas temperaturas, o corpo humano experimenta rapidamente alterações muito deletérias. Em apenas uma hora de um carro fechado no Sol, a temperatura pode aumentar mais de 20º Celsius — avalia Gustavo Gouvêa, cardiologista e coordenador da Unidade Coronariana da Casa de Saúde São José.

Mulher quebra vidro da janela de ônibus após filho passar mal de calor

Uma das situações insalubres que o corpo vivencia é a falta de troca de ar, como menciona a psiquiatra e geriatra Roberta França. Nessa verdadeira “estufa”, a quantidade de gás carbônico aumenta e o ambiente fica mais “pesado”, que dificulta a respiração.

Antonio Carlos Moraes, chefe de clínica médica do Hospital Copa D’or, ainda adiciona um outro fator à maior gravidade do calor em locais fechados: a sensação de claustrofobia, “que agrava os sintomas de palpitação, sudorese e mal-estar”.

O que acontece com o corpo no calor?

— O nosso corpo é inteligente, ele está sempre tentando compensar o sistema — avalia França. — Mas se submetido a um superaquecimento de modo que não seja mais capaz de reverter a temperatura interna, pode acontecer o óbito — acrescenta.

Assim, quando a temperatura interna passa dos 38º — e principalmente quando chega aos 40º —, o corpo promove uma verdadeira força-tarefa para tentar diminuí-la. A primeira linha de defesa é a sudorese. O corpo sua e provoca uma respiração mais intensa, que também faz perder líquido. Se a água do organismo não for reposta, inicia-se um quadro de desidratação, como explica Moraes.

Outra linha de defesa do corpo humano é a vasodilatação: para o sangue conseguir correr e distribuir o calor, as veias são dilatadas. Isso faz com que a pressão tenda a cair, ao mesmo tempo que há um “sequestro” de oferta de sangue para o cérebro, onde a oxigenação diminui, e coração, que aumenta a frequência.

Desse funcionamento, o que vem à tona e é sentido são náuseas, sonolência, mal estar, vermelhidão e maior palpitação no peito. Cãibras também podem ser sentidas pela perda de potássio no suor e pela vasodilatação, além de formigamento e “roxidão” nas “periferias do corpo”, como dedos.

O que fazer

Em uma eventual situação da pessoa ficar presa em um ônibus sem ar-condicionado, por exemplo, a recomendação é, claro, sair o mais rápido possível ou pelo menos abrir alguma ventilação.

— Se tiver como se hidratar é melhor, mesmo se a água estiver quente (com cuidado pois pode atingir altas temperaturas em certos cenários) — recomenda Gouvêa.

O cardiologista também indica que, quando a pessoa sair ou for retirada em uma condição extrema como as que aconteceram nesta semana, ela precisa ser levada para local fresco e arejado para a temperatura corporal diminuir de forma lenta e progressiva.

— Pode-se colocar pano com água fresca no corpo, mas deve-se evitar gelo a fim de não baixar a temperatura muito rapidamente, pois isso pode causar tremores e calafrios e demandar mais consumo de energia pelo corpo — acrescenta.

Também é importante não tentar hidratar uma pessoa que perdeu os sentidos com o calor e está desacordada, pois ela pode engasgar e até gerar uma broncoaspiração, como recomenda a geriatra Roberta França. Para ela, o que se tem a fazer é “tirar as roupas e levar para o hospital mais próximo”.

(O Globo)