Por Agência O Globo27/11/23 às 06H20 atualizado em 27/11/23 às 07H27Andar de bicicleta – Foto: Pexels
Ao acordar após uma noite de sono mal dormida, a última coisa em que você pensa é levantar da cama e ir praticar alguma atividade física. No entanto, um novo estudo liderado por pesquisadores da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, apontou que a capacidade de realizar tarefas mentais melhora durante uma sessão de exercícios de intensidade moderada, independentemente do estado de sono da pessoa.PUBLICIDADE
O sono é fundamental para manter um estilo de vida saudável, sendo recomendado aos adultos entre sete e nove horas de descanso por noite. No entanto, análises recentes indicam que 40% da população mundial não dorme o suficiente.
As consequências da privação crônica do sono incluem doenças cardiovasculares, obesidade, distúrbios neurodegenerativos e depressão. No curto prazo, a falta de sono pode reduzir o desempenho cognitivo, o que prejudica a capacidade de atenção, o julgamento e o estado emocional.
O estudo, que teve a contribuição das Universidade de Chichester, Universidade de Surrey, Universidade Teesside, Universidade de Eletrocomunicações de Tóquio, Japão, e Universidade Estadual de São Paulo, descobriu que o desempenho cognitivo melhora durante uma sessão de exercícios de intensidade moderada, independentemente do estado de sono ou dos níveis de oxigênio da pessoa.
“Sabemos por pesquisas existentes que o exercício melhora ou mantém nosso desempenho cognitivo, mesmo quando os níveis de oxigênio são reduzidos. Mas este é o primeiro estudo sugerir que também melhora o desempenho cognitivo após privação total e parcial do sono e quando combinada com hipóxia (quando não chega oxigênio suficiente às células e tecidos do corpo)”, disse Joe Costello, da Escola de Ciências do Esporte, Saúde e Exercício (SHES) da Universidade de Portsmouth, em comunicado. “As descobertas acrescentam significativamente ao que sabemos sobre a relação entre o exercício e estes fatores de estresse, e ajudam a reforçar a mensagem de que o movimento é um remédio para o corpo e o cérebro”.
O estudo, publicado na revista Physiology and Behavior, envolveu dois experimentos, cada um com 12 participantes (24 no total). O primeiro analisou o impacto da privação parcial do sono no desempenho cognitivo de uma pessoa, e o segundo examinou o impacto da privação total do sono e da hipóxia. Em ambos, todos os participantes experimentaram uma melhora no desempenho cognitivo após cerca de 20 minutos de ciclismo.
“Como estávamos encarando o exercício como uma intervenção positiva, decidimos usar um programa de intensidade moderada, conforme recomendado na literatura existente”, acrescentou Costello. “Se o exercício fosse mais longo ou mais difícil, poderia ter amplificado os resultados negativos e se tornado um fator de estresse”.
No primeiro experimento, os indivíduos só podiam dormir cinco horas por noite, durante três dias. Todas as manhãs, eles recebiam sete tarefas para realizar em repouso e depois enquanto andavam de bicicleta. Eles também foram solicitados a avaliar sua sonolência e humor antes de concluir as tarefas.
Os resultados mostraram que os efeitos de três noites de sono parcial nas funções executivas foram inconsistentes. O artigo diz que uma explicação para isso poderia ser que algumas pessoas são mais resistentes a um déficit de sono leve ou moderado. No entanto, independentemente do estado de sono, o exercício de intensidade moderada melhorou o desempenho em todas as tarefas.
No segundo experimento, os participantes passaram uma noite inteira sem dormir e foram então colocados em um ambiente hipóxico (baixos níveis de oxigênio) nos Laboratórios de Ambientes Extremos da Universidade. Apesar da redução dos níveis de oxigênio, o exercício continuou a melhorar o desempenho cognitivo.
Thomas Williams, do Grupo de Pesquisa de Ambientes Extremos da Universidade de Portsmouth e coautor do estudo, explicou por que a equipe decidiu examinar uma combinação de estressores para o estudo:
“A privação do sono é frequentemente experimentada em combinação com outros estressores. Por exemplo, pessoas que viajam para grandes altitudes também são suscetíveis de sofrer uma perturbação nos seus padrões de sono”, detalhou ele, que completou: “Uma hipótese potencial para explicar por que o exercício melhora o desempenho cognitivo está relacionada ao aumento do fluxo sanguíneo cerebral e da oxigenação, no entanto, nossas descobertas sugerem que mesmo quando o exercício é realizado em um ambiente com baixos níveis de oxigênio, os participantes ainda foram capazes de realizar tarefas cognitivas melhor do que quando em repouso nas mesmas condições”.
O artigo diz que as explicações sobre por que o desempenho cognitivo melhora durante o exercício — mesmo quando uma pessoa está privada de sono e com pouco oxigênio — podem ser alterações na quantidade de hormônios reguladores do cérebro, bem como uma série de fatores psicofisiológicos, incluindo fluxo sanguíneo cerebral, excitação e motivação.
O trabalho sugere que o desempenho cognitivo não depende apenas da área do córtex pré-frontal do cérebro, apesar de desempenhar um papel fundamental no desempenho das tarefas.
“O córtex pré-frontal é altamente sensível ao seu ambiente neuroquímico e altamente suscetível ao estresse”, explicou Juan Ignacio Badariotti, do Departamento de Psicologia da Universidade de Portsmouth, também coautor do estudo, em comunicado. “Regula nossos pensamentos, ações e emoções e é considerado a principal parte do cérebro associada às funções executivas”.
O artigo recomenda uma investigação mais aprofundada para revelar quais mecanismos neurobiológicos estão por trás do processo de função cognitiva. Esta descoberta apoiaria qualquer pessoa que tenha sono interrompido ou pouco oxigênio, incluindo alpinistas e esquiadores, mas também pais de crianças pequenas e trabalhadores noturnos.
Os autores também reconhecem que apenas jovens saudáveis foram incluídos neste estudo e vários indivíduos foram retirados devido a eventos adversos. Eles esperam realizar investigações mais aprofundadas sobre a relação entre desempenho cognitivo e estressores, com uma mistura mais ampla de participantes.
(Folha de Pernambuco)